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O problema das cesáreas no setor suplementar

Você já viu alguma notícia sobre o excesso de cesarianas no Brasil?


Se a gente for comparar as taxas de cesáreas entre os países, o Brasil é um dos que proporcionalmente mais faz essa cirurgia no mundo.


E quando a gente olha para o setor suplementar brasileiro (os convênios médicos, os planos de saúde) a gente percebe que tem proporcionalmente muito mais cesáreas comparado com o setor público brasileiro. E isso é preocupante demais por vários aspectos, vou citar alguns:


  • as cesáreas desnecessárias colocam em risco desnecessário a vida da mulher e do bebê (tem muito muito mais risco de morte ou de sequelas na mulher e no bebê, pode gerar doenças no desenvolvimento e na vida adulta do bebê, pode gerar problemas para as próximas gestações da mulher, tem mais risco de hemorragia pós parto, mais risco de infecção, provoca adesões cicatriciais na mulher, entre tantos outros que você pode ver em outras postagens e notícias);


  • as cesáreas indesejadas e desnecssárias são uma violência para as mulheres (mulheres são ludibriadas para aceitar uma cirurgia desnecessária, para aceitar fazer o agendamento para dias antes do feriadão, semanas antes do natal e ano novo, mulheres são pressionadas a aceitar a cesariana com falsas indicações de cesáreas ou indicações infundadas). Mulheres sofrem uma CIRURGIA que não querem e não precisam! ;


  • quando os profissionais, os hospitais e maternidades estão estruturados para atender predominantemente cesáreas agendadas, as mulheres que vão precisar de uma cesárea de emergência não têm atendimento adequado em tempo certo, as mulheres que precisam de uma assistência a alguma intercorrência acabam ficando sem assistência, as mulheres que desejam ter um parto normal não encontram estrutura mínima para isso;


  • as cesáreas agendadas são a maior causa da prematuridade de bebês no Brasil, internação em UTI neonatal, de bebês nascidos com baixo peso, com desconforto respiratório, de mortes de bebês nascidos cedo demais (a contagem de semanas nem sempre é precisa para indicar qual o dia em que finalmente o bebê estará pronto para ser retirado do útero);


Dê uma olhada nesse mapa abaixo. Esses são os percentuais de nascimentos através de cesarianas pelos planos e convênios de saúde no ano de 2017. É assustador! E essa é só uma parte de um problemão que se chama assistência obstétrica inadequada.






Nossa história nesse debate já tem mais de 14 anos, as taxas continuam aumentando e ainda estamos aguardando ações efetivas das instituições que deveriam estar exercendo suas atribuições legais para proteger vidas.


2006 - Denúncia da PP entregue ao Ministério Público Federal - MPF


Em 2006, a partir das nossas próprias experiências como mães e usuárias do sistema de saúde, nós da Parto do Princípio fizemos um levantamento dos dados nacionais; fizemos um levantamento das pesquisas científicas sobre as implicações das cesáreas sobre a saúde de mães e bebês, sobre a preferência das mulheres grávidas sobre a via de parto; seguida de uma análise, indicação de possíveis razões da banalização da cesárea no setor suplementar e sugestões de ações para ajudar a resolver o problema (com base nos conhecimentos que a gente tinha na época). Segue abaixo o resumo dessas sugestões:



1. Adoção pelos planos de saúde do paradigma já existente no Sistema Único de Saúde, fixando-se tetos máximos para o pagamento de cesáreas, conforme percentuais decrescentes para cada ano.


2. Aumento do valor pago aos médicos para partos normais e diminuição do valor pago pelas cesáreas.


3. Credenciamento de enfermeiras obstetras para assistência ao parto normal em hospitais particulares.


4. Incentivo à construção de Casas de Parto Particulares anexas ou próximas a hospitais (para caso a parturiente tenha necessidade de transferência).


5. Tornar pública as taxas de cesáreas de obstetras e maternidades credenciadas aos planos de saúde.


6. Que o direito ao acompanhante no parto seja estendido à saúde suplementar independente de taxas ou autorizações médicas.


7. Que seja vedado aos planos de saúde a exclusão de cobertura de honorários referentes a partos domiciliares.


Se você quiser ler um pouco mais sobre esse documento, leia aqui:



Isso tudo virou um dossiê que foi entregue como denúncia ao Ministério Público Federal (MPF) solicitando atuação junto à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que é a instituição pública tem a atribuição de regular o setor suplementar para garantir a qualidade dos serviços de saúde oferecidos através dos planos de saúde.


*Pela lei, a ANS tem a responsabilidade pela defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde, elaborar normas, elaborar critérios, fiscalizar, inclusive fazer termos compromisso com as operadoras de planos de saúde "quando houver interesse na implementação de práticas que consistam em vantagens para os consumidores, com vistas a assegurar a manutenção da qualidade dos serviços de assistência à saúde."

(Se quiser, dá uma olhadinha na Lei nº 9.656 de 1998 e na Lei nº 9.961 de 2000)


Entregamos essa denúncia no Ministério Público no dia 28 de julho de 2006 e muita coisa aconteceu desde então.



2007 - MPF convoca Audiência Pública


O MPF convocou várias instituições para uma Audiência Pública intitulada “O excessivo número de cesarianas na rede privada de saúde” para o dia 26 de setembro de 2007. Essa audiência aconteceu no Auditório da Procuradoria da República no Estado de São Paulo e tinha representantes do Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS), Conselho Federal de Medicina (CFM), Conselho Regional de Medicina (CRM), Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), Associação de Hospitais de SP, Federação Brasileira de Hospitais, representantes da Parto do Princípio, muitas mulheres usuárias dos serviços de saúde, representantes de vários hospitais paulistas e representantes de planos des saúde.


No total tinha mais de 200 pessoas nessa audiência em que todos expressaram uma imensa preocupação com as taxas alarmantes de cesáreas no setor suplementar e tudo o que isso poderia indicar sobre a qualidade da assistência obstétrica e as implicações para a vida das mulheres e bebês.


* Para você ter uma ideia, a taxa de cesáreas no setor suplementar era de 77,5% em 2005!

Esse era o dado que a gente tinha porque essas taxas demoram a ser publicadas.


Todos os presentes também concordaram que o melhor para a saúde da mãe e do bebé é oferecer uma boa assistência obstétrica para acompanhar o parto fisiológico e realizar intervenções quando necessárias (cesárea é um dos tipos dessas intervenções).


Nesse contexto, alguns dos encaminhamentos que foram propostos em comum acordo nessa audiência:


  • A ANS se comprometeu a inserir no Rol de Procedimentos a obrigatoriedade da cobertura de um acompanhante de escolha da mulher conforme a Lei do Acompanhante (Lei 11.108 de 2006);

  • Formalização de uma solicitação ao Conselho Federal de Medicina para que esse estabeleça critérios para a realização de cesáreas a pedido da mulher sem indicações clínicas;

  • Criação de certificação para hospitais que realizem assistência a partos naturais (de forma análoga à certificação Hospital Amigo da Criança);

  • Realizar campanhas de conscientização de profissionais e de mulheres;

  • Elaboração de uma cartilha oficial com informações sobre os benefícios do parto normal, direitos das mulheres grávidas, riscos de uma cesárea desnecessária;

  • Assegurar que enfermeiras obstetras possam ser responsáveis pela assistência direta a partos naturais;

  • Fomentar a criação de Centros de Parto Normal anexos a hospitais;

  • Atuar junto à formação de novos profissionais médicos com capacitação para atuação na assistência ao parto embasada em evidências científicas;

  • Rever a diferença na remuneração de profissionais na assistência ao parto e na assistência à cesariana (diante dos indicativos de que há predileção por parte dos médicos pela cesariana por causa da remuneração);

  • Tornar disponível publicamente as taxas de cesáreas e partos de médicos, hospitais e operadoras de planos de saúde.


Link da notícia dessa audiência pública:



2010 - MPF ajuiza Ação Civil Pública contra a Agência Nacional de Saúde Supementar - ANS


Após 3 anos em diálogo entre o MPF e a ANS sem acordo sobre a execução de ações efetivas por parte da ANS, o MPF ajuizou uma Ação Civil Pública em 24 de agosto de 2010.


A Ação exige que a ANS regulamente a os serviços obstétricos privados, acatando muitas sugestões do dossiê da Rede de Mulheres Parto do Princípio.


Ref. Representação contra ANS

Protocolo: 1.34.001.004458/2006-98.


ACP nº 0017488-30.2010.4.03.6100, distribuída à 24ª Vara Federal Cível de São Paulo


Link da notícia:


Veja a íntegra do documento da Ação Civil Pública:



2014 - Juiz convoca Audiência Pública


Após muitas idas e vindas, o juiz da 24ª Vara Cível de São Paulo responsável pelo caso convocou uma Audiência Pública para o dia 6 de agosto de 2014 no Fórum de São Paulo-SP.


Lá fomos nós junto com várias outras entidades, junto com um tantão de mulheres mães e bebês, junto com Ministério da Saúde, Universidade, representantes de planos de saúde, médicos peritos, Conselho Federal de Medicina, e outros representantes. Auditório lotado, todos concordando com a urgente necessidade de executar ações efetivas para melhorar a assistência obstétrica e diminuir as taxas de cesáreas desnecessárias e indesejadas.

*Naquela época, a referência era o ano de 2012 que apresentou 84,6% de cesáreas no setor suplementar!!!



2014 - ANS atende parcialmente a dois pontos da Ação Civil Pública


Como forma de responder à pressão do judiciário, a ANS atendeu às exigências de:

  • determinar que todas as operadoras forneçam os percentuais de cesarianas e partos normais de obstetras e hospitais credenciados e

  • definir a obrigatoriedade do uso do Partograma para todos os nascimentos.


Para inclusão desses, a ANS abriu duas Consultas Públicas para o período de 24 de outubro de 2014 a 24 de novembro de 2014:

Consulta Pública nº 55 e nº 56 sobre o direito de acesso à informação das beneficiárias às taxas de cirurgias cesarianas e de partos normais por estabelecimento de saúde e por médico e sobre a obrigatoriedade da utilização do partograma, do cartão da gestante e da carta de informação à gestante


A participação da sociedade civil foi massiva e incisiva na parte de desburocratizar e facilitar o acesso das mulheres a taxas de cesáreas dos médicos, dos estabelecimentos de saúde, das operadoras e do setor suplementar.


Outro ponto que reivindicamos foi:

- que as taxas de cesáreas dos estabelecimentos de saúde (hospitais e maternidades) a serem publicizadas pela ANS fossem as que foram remuneradas pelo plano de saúde.

A ANS não acatou à essa reivindicação.


Muitos hospitais e maternidades possuem dupla porta (assistência pública e privada), e a maioria presta serviços diferentes dependendo da forma de remuneração (lei do acompanhante, RDC 36/2008 da ANVISA, cesáreas eletivas, forma de tratamento, entre outros).

*E essas diferenças são o cerne de outras frentes de trabalho da Parto do Princípio.


Considerando as diferenças no atendimento, não faz sentido que a ANS publicize o total de nascimentos que acontecem em um hospital que atente com e sem planos de saúde.



2015 - ANS publica RN com esses dois pontos da Ação Civil Pública


Em 6 de janeiro de 2015, foi publicada a Resolução que consolida o que foi construído nesse processo. Segue a baixo o resumo do conteúdo dessa Resolução:


Resolução Normativa nº 368 da ANS - 06 de janeiro de 2015

As novas medidas visam incentivar o parto normal e coibir a prática de agendamento de cesarianas sem trabalho de parto e incluem:


1) a obrigatoriedade do fornecimento e preenchimento do “cartão da gestante”, com todas as informações sobre o pré-natal, para que a mulher possa ser atendida com segurança por qualquer profissional quando ela estiver em trabalho de parto ou em caso de intercorrências.


2) que o cartão da gestante apresente uma “Carta de informação à gestante” sobre os seus direitos, incluindo o direito ao acompanhante sem pagamento de taxas extras e sobre como consultar a taxa de cesarianas dos serviços e profissionais vinculados à operadora.


3) a divulgação, a pedido da mulher, das taxas de cesariana dos profissionais e serviços credenciados pela operadora e


4) Torna-se obrigatória a utilização do partograma para o pagamento do procedimento de parto. Através do partograma, o médico ou enfermeiro obstetra acompanha e registra a evolução do trabalho de parto, com sinalização de necessidade de alerta ou de ação, incluindo a necessidade de cesariana.




Graças à mobilização das mulheres para realizar a denúncia inicial entregue ao MPF, à Ação Civil Pública ajuizada pelo MPF e a atuação do judiciário sobre a ANS somada com a participação da sociedade nessas Consultas, hoje as taxas de cesáreas das operadoras e dos serviços credenciados são públicos (no próprio site da ANS) e qualquer pessoa pode verificar esses indicadores. Mas, observe que não há no texto da Resolução a restrição para considerar apenas os procedimentos que forem cobertos pelo plano de saúde no cálculo das taxas de cesáreas dos estabelecimentos de saúde. Apesar do juiz ter deixado esse detalhe explicito na Sentença, isso foi ignorado no texto da resolução.


Ainda é surreal lembrar que não tínhamos direito a essa informação! Como consumidoras, é nosso direito saber se esse ou aquele plano de saúde, aquele hospital ou aquele médico realizam assistência a parto normal!


O repasse da informação sobre as taxas de cesárea dos médicos ainda ficou dependendo da solicitação da usuária. Mas vários grupos de mulheres se uniram para a alimentar planilhas públicas com os dados que cada uma coletou - elas pediam as informações a seus planos e depois consolidavam nessas planilhas. Esse trabalho de formiguinha é muito valorizado inclusive pelo Prof. Cesar Victora, epidemiologista brasileiro que já foi indicado ao “nobel” da categoria.


*Na abertura do Congresso da ABRASCO de 2015 ele falou sobre o assunto e destacou que a cesariana desnecessária era responsável por 23% das mortes materna no Brasil!



2015 - Juiz emite Sentença condenando a ANS a cumprir as demais exigências da Ação Civil Pública


E em 27 de fevereiro de 2015, o juiz da 24ª Vara Federal Cível de São Paulo emitiu sua sentença condenando a ANS a cumprir as demais exigências do MPF na Ação Civil Pública. Os itens exigidos estão resumidos abaixo:


a) determine às operadoras de plano privado de assistência à saúde que forneçam a seus beneficiários, a pedido destes e em determinado prazo fixado pela ANS, os percentuais de cesarianas e partos normais efetuados pelos obstetras e hospitais remunerados pela operadora no ano anterior ao questionamento;


b) defina, segundo seus critérios técnicos, um modelo de partograma e estabeleça como documento obrigatório a ser utilizado em todos os nascimentos, como condição para recebimento da remuneração da operadora;


c) determine a utilização do cartão da gestante como documento obrigatório;


d) determine às operadoras e hospitais que sejam obrigados a credenciar e possibilitar a atuação dos enfermeiros obstétricos no acompanhamento de trabalho de parto e parto;


e) crie indicadores e notas de qualificação para operadoras e hospitais específicos para a questão da redução do número de cesarianas e adoção de práticas humanizadoras do nascimento;


f) estabeleça que a remuneração dos honorários médicos a serem pagos pelas operadoras seja proporcional e significativamente superior para o parto normal em relação a cesariana, em montante a ser definido pela ANS segundo seus critérios técnicos.



2016 - ANS atende a mais um ponto da Ação Civil Pública - obrigatoriedade de credenciamento de enfermeiros obstétricos e obstetrizes


E ainda, acatando mais uma das exigências da Ação Civil Pública, a ANS publicou a Resolução Normativa nº 398 em 5 de fevereiro de 2016 que dispõe da obrigatoriedade de credenciamento de enfermeiros obstétricos e obstetrizes por operadoras de planos privados de assistência à saúde e dispõe sobre a obrigatoriedade de os médicos entregarem a Nota de orientação à mulher grávida.



Mas a Ação Civil Pública exigia muito mais que isso e a ANS não apresentou evidências de que realiza ações de regulação para garantir a qualidade dos serviços de saúde oferecidos pelas operadoras de planos de saúde.



2016 - Conselho Federal de Medicina finalmente estabelece critério para restringir a realização de cesáreas sem indicação clínica


A atuação do judiciário foi para além dos inicialmente citados como parte no processo.

Em 17 de março de 2016, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publica sua resolução para estabelecer critérios para a realização das cesáreas a pedido da mulher sem indicação clínica.


*Esse encaminhamento já tinha sido apresentado naquela Audiência Pública de 2007 convocada pelo MPF.

Naquela Audiência de 2007, o CFM apresentou sua imensa preocupação sobre o boom de prematuros nascidos por cesáreas agendadas e se comprometeu de elaborar critérios para a realização de cesáreas a pedido da mulher sem indicações clínicas para a cirurgia.


Resolução 2144 de 2016 do Conselho Federal de Medicina

17 de março de 2016

Resolução do CFM permitindo aos médicos realizarem cesáreas eletivas a pedido da mulher desde que ela seja plenamente esclarecida dos riscos envolvidos na cirurgia e essa seja realizada a partir da 39ª semana.


Uma das questões destacadas na discussão:

Para o agendamento de cesáreas sem indicação clínica, os profissionais médicos estão considerando que o período permitido pela texto da resolução se inicia no primeiro dia após completar 38 semanas alegando que essa é a 39ª semana.


O CFM reconhece o probelma e já anunciou em 2018 que eles irão publicar outra Resolução para substituir “39ª semana” por “39 semanas completas” a fim de evitar essas interpretações errôneas. Estamos aguardando.



2016 - ANS recorreu da sentença


Em 20 de janeiro de 2016, a ANS entrou com uma Apelação contra a Sentença. Abaixo algumas das questões alegadas pela ANS contrárias à exigência de estabelecer remuneração proporcional e superior para a assistência ao parto comparada à assistência à cesariana:

  • a ausência de atribuição da ANS para fixar valores de remuneração de prestadores de serviços;

  • os riscos de oferecer incentivos financeiros para profissionais médicos sem experiência na assistência a partos vaginais.


* Essa sugestão de oferecer uma remuneração maior para a assistência a partos vaginais consta nas sugestões da Parto do Princípio no Dossiê de 2006.

Naquela época, não havia resultados de pesquisas sobre intervenções nesse aspecto nem no Brasil ou em outros países, mas foi incluída como sugestão no documento pois a principal causa apontada pelos profissionais médicos e pelas associações médicas quando questionados sobre as altas taxas de cesáreas no Brasil é a remumeração por tempo de trabalho da cirugia agendada comparada com a remuneração da assistência a trabalho de parto sem previsão de data de início ou tempo de duração.



2018 - Tribunal analisa Apelação da ANS e convoca Audiências


Mais tantas idas e vindas, Apelação apresentada pela ANS contestando a sentença e a juíza do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) convocou uma Audiência Pública para o dia 4 de dezembro de 2018.


Nessa Audiência Pública, mais uma vez todos estavam extremamente preocupados com as imensas implicações das cesáreas desnecessárias e indesejadas para vida das mulheres e seus bebês. As falas expuseram os conflitos de interesses de profissionais médicos, a prematuridade provocada pelas cesáreas agendadas, a dor de mulheres que foram submetidas a uma cirurgia desnecessária sob alegação de falsas indicações, a dor da mãe que viu seu filho internado por ter sido retirado cedo demais, falas de obstetrizes, enfermeiras obstetras e gestores dizendo que é possível fazer diferente, fala dos movimentos de mulheres trazendo esse peso dessa luta coletiva.



Nessa audiência, a partir de todas essas falas, a desembargadora determinou a formação de um Grupo de Trabalho com integrantes da ANS, do MPF, da Parto do Princípio, do Sentidos do Nascer/UFMG, do Programa Parto Adequado, da REHUNA, da Unimed do Brasil, da EACH-USP, do CFM, do FBH, da FENASAUDE, da ABRAMGE/SINAMGE, da Unidas, da ANAHP, do Projeto Apice-On, do COREN, da ANVISA, da Faculdade de Saúde Pública-USP e da ADOSP para criar propostas de:


1. Indicadores suficientes e adequados, a serem adotados pelas maternidades tendo como referência os indicadores da Rede Cegonha, do Programa Parto Adequado e do Projeto Apice-On do Ministério da Saúde, entre outras contribuições;

2. Estabelecimento de metas e prazos para cumprimento desses indicadores propostos;

3. Definição dos integrantes das equipes multidisciplinares para a atenção obstétrica e neonatal;

4. Promoção de atividades de educação continuada na área de atenção obstétrica e neonatal;

5. Introdução da exigência gradual do credenciamento, nas operadoras de plano de saúde com cobertura obstétrica e nas instituições de assistência ao parto, de médicos capacitados para assistência pré-natal, ao parto e nascimento baseada em evidências;

6. Promoção de ações educativas e divulgação sobre os direitos das mulheres e bebês no parto e nascimento, bem como dos benefícios do parto normal para as mulheres e crianças.

VI - A finalidade deste conjunto de propostas é subsidiar a Agência Nacional de Saúde, o Conselho Federal de Medicina e a ANVISA a efetivarem medidas de regulação e indução da mudança de paradigma atual, que coloca o Brasil nos primeiros lugares entre os países com maiores taxas de cesarianas no mundo.


*A gente não sabia na época (esses dados demoram para ser publicados), mas a taxa de cesáreas do ano anterior (2017) era de 85,95% no setor suplementar brasileiro!!!!

Quantas dessas foram cesáreas desnecessárias e indesejadas?

Quantas foram as mortes e sequelas evitáveis?

Quando a ANS vai exercer seu papel regulador e criar medidas que garantam uma atenção obstétrica de qualidade e segurança para todos os planos de saúde?


Ainda teve outra Audiência convocada pela juíza do TRF-3 para o dia 12 de fevereiro de 2019 e outra Audiência no dia 30 de abril de 2019.



2019 - Desembargadora determina que a execução provisória da sentença apelada será feita no Juízo de Primeiro Grau


No dia 30 de abril de 2019, a desembargadora determinou que a execução provisória da sentença apelada será feita no Juízo de Primeiro Grau e determinou o prosseguimento da terceira fase do Programa Parto Adequado.



2019 - Juiz de Primeiro Grau determina prazo de 30 dias para que a ANS comprove ações previstas na Sentença


Após tantas outras idas e vindas e diante da ausência de ações efetivas de regulação por parte da ANS sobre a assistência obstétrica oferecidas pelos planos de saúde, em 23 de maio de 2019, o juiz da 24ª Vara Federal Cível de São Paulo determinou um prazo de 30 dias para que a ANS comprove execução das ações previstas na sentença para redução das taxas de cesáreas e aprimoramento da atenção obstétrica.


Veja aqui a Decisão:





O juiz determina que a ANS comprove ações garantindo efetividade da Resolução Normativa 398 de 2016 da ANS possibilitando efetivo credenciamento de enfermeiros obstétricos e obstetrizes em operadoras de saúde hospitais conveniados, bem como ressarcimento pelos serviços e consultas por eles prestados, seja em atendimentos nas entidades hospitalares seja em consultas pré-natais e pós-parto;


E determina também que a ANS comprove a criação de indicadores e notas de qualificação para operadoras e hospitais a fim de reduzir as taxas de cesarianas e adoção de práticas humanizadas no nascimento, inclusive com amparo no documento científico elaborado pelo Grupo de Trabalho criado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região.



2020 - ANS apresenta proposta de oferecer Selo de Qualidade para as operadoras que optarem se submeter a uma breve avaliação


Essa proposta da ANS foi submetida a um processo de Consulta Pública: Consulta Pública nº 79 (encerrou dia 23 de outubro de 2020).


Esse Programa de Certificação porposto pela ANS:

- não considerou o documento elaborado pelo Grupo de Trabalho (apesar da determinação judicial);

- não prevê obrigatoriedade por parte das operadoras de se submeterem à avaliação;

- entre as operadoras que se voluntariarem para participar do Programa, só uma parte dos hospitais credenciados será considerada na avaliação;

- a avaliação possui em sua grande parte indicadores burocráticos e pouco irá verificar a adoção de práticas humanizadas na atenção obstétrica;

- a metodologia proposta para aferição dos poucos indicadores propostos é inadequada;

- cria um "Formulário" que pode oferecer brechas para a realização de mais cesáreas sem indicação clínica antes das 39 semanas.


As operadoras de planos de saúde poderão, de forma voluntária, optar por participar desse Programa de Certificação.


Essas operadoras poderão indicar alguns hospitais de sua rede para avaliação.


Essa breve avaliação proposta possui itens considerados "essenciais", "complementares" e de "excelência".

(lembrando que serão avaliados poucos requisitos e que são pouquíssimos os que se referem à assistência direta à mulher e seu bebê).


Caso consigam demonstrar que parte de seus hospitais contempla uma pontuação mínima desses pré requisitos, a operadora receberá o "Selo de Qualidade".


Nada previsto para as operadoras que não se interessarem em participar do programa.

Nada previsto para os demais hospitais que a operadora não indicar para a avaliação .

Nada previsto para os hospitais e operadoras que não conseguirem atingir a pontuação mínima para receber o "Selo de Qualidade".

Nada previsto para as mulheres que não escolhem plano de saúde (plano de saúde através da empresa em que trabalha, ou através do sindicato ou associação que faz parte).


O que realmente significa um Selo de Qualidade desses?


83,9% dos usuários de planos de saúde são coletivos empresariais ou por adesão.

A imensa maioria das mulheres asseguradas não escolhe a operadora de plano de saúde.


Por que a ANS não fiscaliza e avalia o seu plano de saúde?


Por que a ANS não exige que o seu plano ofereça uma assistência obstétrica minimamente qualificada, com práticas embasadas cientificamente, com a segurança que toda paciente tem o direito de ter?


Você que mora em uma região em que nenhuma operadora de planos de saúde quis se submeter à avaliação da ANS, que liberdade de escolha você tem?


Por que a ANS não regula os planos da sua região também?


A ANS tem a atribuição legal de regular TODOS.


Para que serve o Selo de Qualidade?


Não queremos Selo.


Queremos qualidade e segurança para todas.




2020 - ANS submete à Consulta Pública a inclusão de acompanhamento pré natal por enfermeiros obstetras e obstetrizes no Rol de Procedimentos


A partir da Ação Civil Pública e do Cumprimento de Sentença de 2019, a ANS deve garantir "efetividade à Resolução

Normativa 398/16, possibilitando efetivo credenciamento de enfermeiros obstétricos e obstetrizes em operadoras de saúde hospitais conveniados, bem como ressarcimento pelos serviços e consultas por eles prestados, seja em atendimentos nas entidades hospitalares seja em consultas pré-natais e pós-parto."


A inclusão dos enfermeiros obstetras e obstetrizes na assistência ao pré-natal foi submetida a Consulta Pública nº 81 (consulta encerra dia 21 de novembro de 2020).


E também depende da fiscalização ativa da ANS.


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