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Relato de parto de Anita Cione, nascimento da Ana Flor

Um parto natural, domiciliar, na água, que quase aconteceu no hospital, porque a mãe estava desistindo depois de 20 horas de trabalho de parto ativo.

 

Quando engravidei, eu e o Ti, estávamos com 21 e 23 anos. A gente desejava muito ter um filho e por isso dávamos altas vaciladas, pois conscientemente não queríamos engravidar. Nossos planos eram largar tudo aqui e viajar pelo mundo assim que ele se formasse. Queríamos ter uma deliciosa vida de cigano, pegando carona, enfim, espíritos livres... Também tínhamos planos de morar no campo, sem tv, sem telefone, e termos um monte de filhos..

 

Esse forte desejo de sermos pais trouxe a gravidez. Foi susto. Eu já tinha fantasiado tanto com isso e agora era verdade...

 

Na hora fiquei sem reação e o Ti começou a chorar de emoção, já dizendo que nunca faltaria nada pro nosso filho, com um olhar brilhante cheio de carinho... Tive uma gravidez super tranquila, todos os exames ok, yoga, dança, meditação e preparação da família que quase surtou ao saber das nossas intenções de ter um parto natural em casa.

 

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Chegando no fim foi dando um friozinho na barriga, tudo já pronto, quartinho de bb, bola , banheira inflável.

 

As dores começaram a 1 da manhã e começamos a marcar a freqüência. Rolava de 2 em 2 minutos certinho.

 

- Que dor !

 

Fui pro chuveiro...

 

Às 2 e meia continuava de dois e dois minutos. Ligamos pra Cris, a doula, que confirmou que era TP e tava vindo pra cá. Aí é que deu friozinho na barriga mesmo! A Cris chegou e me pôs sentada na bola. Ligou pra Andréa, a médica e cuidou de tudo... Eu com meus botões pensava: de 2 em 2 minutos, vai ser rapidinho! Que bom, já estou bem engrenada!

 

Ás 8 da manha chega a equipe, que me faz um toque. Eu tava com 3 pra 4 cm de dilatação.

 

Acho que na gravidez eu romantizei muito o parto. Eu lia a lista e imaginava que parir seria um êxtase! Minha total comunhão com o universo parindo um bb tao amado!

 

Mas na hora, eu só sentia uma puta dor fudida do caralho!!! Meu, é muita dor!!! Horas e horas de contração de 2 em 2 minutos é muito foda!! Fui pra banheira...

 

Ai que delícia, o corpo mais leve...

 

Tava tudo correndo bem...o Ti ali comigo, cada segundo, só faltava sentir dor também...

 

A Letícia ali mentalizando, o pessoal na sala conversando, a cris cuidando de mim com todo seu arsenal...moxabustão, cromoterapia, do-in, respiração..teve até pirâmide de cristal...

 

Lá pelas tantas (não sei q horas) pedi mais um toque. Tava com 5 pra 6 cm!!!!

 

Não acreditei! Não sei se demonstrei muito, mas fiquei revoltada, já tava na hora do almoço e eu desde a uma da manhã de 2 em 2 minutos!!!

 

A partir desse momento, procurei ter outra postura, desencanar da dilatação, me concentrar melhor...

 

Senti uma presença muito divina no ar, ouvimos várias vezes os hinos do Daime, que tem significado muito forte para nós...

As horas passaram... Eu saia da banheira, andava, ficava parada, ganhava massagem , sentia frio, calor e, principalmete a dor, que nao dava trégua. Eu me achei tao louca nessa hora por querer ter um parto em casa, sem anestesia, q q é isso!!!?

 

Devia ser umas 4 da tarde e pedi mais um toque : 7 cm!!

 

A Andréa tentava me animar: " tá evoluindo, é o seu ritmo, cada mulher tem o seu, o nene ja ta encaixado, bem baixinho, o colo fininho..."

Depois disso, eu nao lembro muito bem mais... Sei que passou um tempão e eu pedi mais um toque: 8 cm! Já tava anoitecendo... Lembro de pensar: vi o dia amanhecer e agora anoitecer e eu aqui. Senti raiva de todos, tão tranquilos lá na sala e eu aqui sofrendo. Até que parou de evoluir: 4 horas depois do último toque eu ainda tava com 8 cm...a noite ja ía adentro... A Andrea então estourou a bolsa: “Socorro, mecônio!” Depois de avaliar o líquido amniótico, ela viu que tava tudo bem. Os batimentos tavam ok, tudo ok... Mas eu fiquei realmente desesperada porque já era 8 da noite! Quando isso ia acabar? Gritei que queria ir pro hospital, que queria cesárea e o pessoal me convencendo: “Ta tudo bem com vc, com o bb, nao precisa ir pro hospital”. E eu fiquei louca, meu!

 

QUERO IR PRO HOSPITAL, PORRA!!!!

 

Ai o Ti veio falar comigo: “Nao você nao quer, depois vc vai se arrepender. E tudo que a gente fez até aqui, todos esses meses?”

 

Não quis nem saber. Em alguns minutos tava todo mundo se preparando pra ir pro hospital. Eu vesti uma roupa e aí vi uma cena que cortou meu coração: o Ti foi fazer a minha mala do hospital chorando.

 

Nesse momento vi que tinha enfiado uma faca no nosso amor...

 

Mais um toque: 9 cm.

 

Aí tirei a roupa e fui pra banheira pra morrer. Sei lá, não existia mais esperança em mim, quis ir pra banheira pra morrer, mas não fazer meu amor chorar mais.

 

A Cris ficou falando que eu tinha que dar beijo na boca do Ti pra soltar a garganta, que eu tava com ela muito presa e isso tem relação direta com a vagina... Eu nem dei bola na hora, mas ela insistiu, ficou até séria. E aí a gente beijou. Juro que não achei que fosse dar certo, mas comecei a sentir vontade de fazer força... Uau! Isso que é energia forte! A força vem e não tem como segurar! A Andrea pediu pra eu não fazer força ainda, porque não tava tudo dilatado. Eu sentia a cabeça do nenem empurrar com toda força.

 

Achei que ia rasgar tudo! Gente! Como a equipe foi paciente! Não deve ser fácil aguentar uma mulher parindo... A galera começou a sentar em volta da banheira, pôr luva, e eu ja podia fazer força. Que delícia! O expulsivo é uma delícia perto da dilatação...

 

Sentir a cabeça do neném vindo, querendo sair, é um puta bagulho violento! É forte ! É quando vc fica forte, ativa. É vc que faz a força. É outra dor, é uma dor do finalzinho, sei lá, é boa... Comecei a fazer força. Gritava. Fazia pra valer! Que gostoso, ia nascer mesmo!

 

O Ti me sustentava de cócoras e eu sentia q a cabeça ia sair.

 

Tava coroando, mas a Andrea empurrou um pouquinho de volta pra dentro. Na hora nao entendi, depois soube q era pra sair devagar e não lacerar o períneo. Fiz mais forca e pronto. Saiu a cabeça. Mais força, tem q sair rápido, pronto saiu!!! Que choque! O bb veio pro meu colo, todo quentinho, de olho aberto, mao aberta, tão lindo, com a cabeça redondinha, a carinha linda!!! Fiquei ali, em silêncio, olhando... Logo vieram fraldinhas pra secar, negocinho de aspirar a boca...

 

Achei que esse negocinho pra aspirar não tava funcionando muito e o bb parecia meio engasgadinho pra chorar. Aí eu pus a boca mesmo, aspirei a boquinha do nene sugando com a minha e cuspindo na banheira... Bom, passado esse primeiro momento, alguém perguntou: “Alguém viu o sexo do bb?" A gente não tinha querido saber o sexo na gravidez e na hora q nasceu eu nem lembrei, nem olhei, dá pra acreditar?!!!

 

Uma menina!!! Menina, menina!!!

 

Ai pediram pra eu sair da banheira pra avaliar o sangramento. Levantei com bb no braço e cordão pra dentro ainda, ligado na placenta e fui andando até o quarto.

 

Massagens pra placenta sair. O Ti cortou o cordão. Tudo alegria! Nem acreditava q tinha terminado e tinha ali uma bb, q tinha 3,600kg!!! O períneo estava inteiro. Nenhuma laceração, não ia ter q costurar nada!! Fui pro chuveiro tomar uma duchinha quente... Nossa! A periquita fica ardendo paca depois do parto... Bom, acho q é isso....

 

2 dias depois o nome: ANA FLOR , escolhido com muito amor!

 

Anita Cione 

São Paulo- SP

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